Quioto, onde o Japão se materializa (ou se espiritualiza?!)

Sabrina Sasaki
12 min readMay 6, 2018

A cidade de Quioto (Kyoto, em japonês 京都, que significa capital )- antiga sede imperial e destino turístico mais popular por aqui - é conhecida por preservar o gosto tradicional do Oriente. E otras cositas mas…

Esse é meu 2o post sobre o Japão, então dá uma olhada nas dicas para sua 1a vez por aqui.

Como residente, comecei uma série de dicas pra amigxs e nunca publiquei, então dessa vez deixei a preguiça de lado e resolvi dividir com outros viajantes algumas ideias sobre o Japão. (na verdade, quero convencer mais amigxs a virem me visitar antes que eu me vá de vez…)

Uma das partes mais locais de Quioto: o rio Kamo (Kamogawa). Fotos: Tugi Guenes (Série: Fall in love with Kyoto)

Na 1a vez pelo Japão, parece que todo viajante decide conhecer todos os lugares ao mesmo tempo, tudo junto e misturado. Dá uma olhada nesse roteiro de 10 dias que esse casal português fez — parece interessante, mas eu recomendaria alguns breaks pra aproveitar melhor sua grana. Eles parecem ter preferido Quioto a Osaka (comum para turistas ocidentais), e comprado o bilhete JR Pass válido para o Shinkansen — o trem bala. O site tem informações básicas em português, mas na dúvida procure a Tunibra, na Praça da Liberdade (SP), que eles te ajudam a entender os detalhes.

Atravessar o mundo e chegar aqui do outro lado pra deixar de ver algo tão sonhado soa realmente frustrante! Com o JR Pass em mãos, é gratificante e vale a pena ficar cada dia em um lugar; já sem o JR pass, é melhor planejar alguns lugares pra evitar surpresas e pegadinhas com o complexo sistema de transporte japa(e tb uma das partes mais caras por aqui).

Quioto tem os famosos festivais de Primavera, Verão e Outono, sempre com gueixas. Fonte: Kyoto VR.

Fica a dica: estabelecer poucas bases fixas e fazer day-trips para lugares próximos é uma forma de gastar menos e aproveitar melhor os dias. (Com o JR Pass ou sem ele). Transportar bagagens no Japão pode ser uma novela, se tiver muitos volumes ou coisas pesadas.

Esqueça o seu conceito de espaço — a palavra de ordem aqui, como bem explica Marie Kondo, é minimalismo! E espaço mínimo, por isso, esteja preparado pra filas, locais minúsculos e sempre cheios.

Destinos: pra quem está com grana curta e/ou não vai comprar o JR Pass, se tiver que escolher apenas dois locais pra se visitar, recomendo Quioto (a antiga capital) e Tóquio (a “nova” capital). De cada uma dessas cidades, é possível visitar as demais regiões/cidades durante o dia, com outros tipos de passes de turismo ou mesmo com o JR West (apenas para a região de Kansai e Hiroshima).

Detalhes do trecho Tóquio-Quioto em Português: Blog ViajarOMundo.

1a vez no inverno/1998. (nem me pergunte onde essa foto foi tirada pois fiquei confusa com templos/jardins)

Quando estive em Quioto pela 1a vez, lá em 1998, lembro de ter ficado surpresa com a quantidade de elementos tradicionais e milimetricamente planejados. Tudo parece ter sido feito com muita precisão nos detalhes: jardins, cerimônias de chá, esculturas, ikebana, cerâmica, danças, gueixas. E como uma adolescente cansada de visitar templos e shrines, essa lembrança ficou na memória. Na época, estava viajando pelo país inteiro com meu pai e mal tive tempo de assimilar tudo que me cercava nos poucos dias em que aqui ficamos. Era inverno e o frio pedia ambientes aquecidos e fechados — o inverno em Quioto é conhecido por não ser dos mais agradáveis no Japão.

2a vez: Mochilao 2014. Um rolê durante a primavera (recomendável).

Logo, em 2014, quando decidi mochilar pelo Japão sozinha, Quioto foi a 2a base escolhida para uma semana em Kansai (região que compreende Osaka, Kobe, Quioto e Nara). Não poderia ter feito escolha melhor: no meio da primavera, logo após a temporada de cerejeiras, e quase no início da temporada das chuvas.

Quioto, a cidade mais famosa quando se fala em turismo histórico, merece pelo menos de 4 a 5 dias. Todo mundo que vem pra ficar apenas 1 ou 2 dias se arrepende. E volta depois.

É também uma das cidades japonesas mais conservadas, já que nunca sofreu terremotos fortes nem foi destruída pela 2a Guerra — se tiver interesse, essa reportagem da BBC explica os motivos. (Nara também está intacta, pelos mesmos motivos, mas pra falar de Nara, farei outro post.)

Quioto é a cidade conhecida por ter a arte e os cerimoniais tradicionais e toda a indústria que os sustentam: matchá (cha verde), cerâmica, tecidos e kimonos, caligrafia. Foi o berço da aristocracia japonesa, com artes finas financiadas pelos xogunatos mais prósperos da história japonesa.

Comes e Bebes

Almoço simples: prato principal (macarrão do tipo udon com tofu frito), arroz, conservas e soja. Preço: JPY 500 (R$ 15,00)
  • TripAdvisor: tem muita coisa boa e também várias roubadas. Já que os japoneses não usam a plataforma como os ocidentais, a maioria das resenhas podem ter sido de estrangeiros a turismo, com pouco conhecimento pra avaliar a variedade de possibilidades locais.
  • Dica: em geral, quando um americano, australiano, britânico ou suiço escreve "barato" ou "budget" não condiz com a realidade de brasileiros.
  • Tabelog: o guia que os japoneses utilizam pra checar opções de restaurantes, e conta com uma versão em inglês. Mas como todo site bilíngue japa, informações em inglês são reduzidas se comparadas ao volume em japonês.
  • Reservas: os melhores restaurantes em Quioto exigem reservas antecipadas, por isso se prepare, caso sua vontade seja experimentar pratos preparados por chefs locais.
  • Dica: os menus de almoço costumam sair de 50% a 70% mais em conta que o jantar, por isso fique atento aos horários de atendimento.
  • Restaurantes familiares (os que exibem pratos de plástico na vitrine) servem como ótima alternativa para refeições rápidas, práticas e mais em conta: lámen (o ramen), udon, curry rice, arroz e frango, porco ou peixe.
  • Preços: Variam conforme o prato, restaurante e horário. Mínimo: JPY 500 (R$ 15,00). Os mais caros são os que servem pratos a la carte: carne (Kobe, Wagyu or Ohmi bife), como sukiyaki, shabu-shabu & sushi/sashimi (é claro).
  • Kaiten: Opção de sushi e combinados como estamos acostumados no Brasil, mas servidos numa esteira e cobrados por par, unidade ou porção. Porção de tekka maki ou kappa maki : JPY 108 (R$ 5,00).
  • Budget: Kaiten Sushi na Av. Kawaramachi (perto do mercado central). Mas nem adianta tentar achar no Google, pois como você pode notar, nem todos os locais existem no Google maps — esse aqui, pelo menos fica em frente a um ponto histórico, então fica mais fácil identificar. Só clicar aqui e seguir adiante. Fica aberto até as 22h, com último pedido até as 21:30h. Eles também preparam porções pra viagem, caso queiram levar pra casa ou fazer um pique-nique à beira do rio — super recomendado!

Rolês pra brasileiros

Se fosse pra fazer a lista completa de lugares imperdíveis de Quioto, eu teria que passar uns 5 anos aqui — em 3, ainda não consegui ver os mais de 1000 templos e shrines espalhados pela cidade. Existem os preferidos dos estrangeiros, e também os dos locais. Vou pelo gosto pessoal, e depois menciono outros bem votados nos próximos posts.

Apenas 1 dia (levanta cedo ou nem dorme — em 24h, não se vê muito!)

O ideal seria distribuir esse roteiro em 2 dias, mas fiz esse roteiro de um dia pra Nat Tsuka. (um dia é realmente puxado e exige muito deslocamento — evite se estiver com crianças ou idosos)

Sugestão de roteiro: Higashiyama - Kyomizudera, Maruyama Park & Chion-in + Heian Shrine + Castelo Nijo + Palácio Imperial + Mercado Nishiki.

Manhã do 1o Dia: Leste do Rio Kamogawa, emHigashiyama (Montanha do Leste). Se perca a vontade!

6:30 - Templo Budista Kiyomizudera (templo da água sagrada): considerado o mais tradicional de Quioto, e listado como Patrimônio da Humanidade — UNESCO. Está sempre lotado, por isso madruge aqui! O templo abre às 6h da madruga, já que o sol costuma sair as 5h.

Prazer, Kyomizudera! Essa vista é a que vc terá que esperar até 2020 pra ver de novo (em reforma).
  • Chegue antes dos demais turistas: ruas estreitas + pouco espaço.
  • Curta o silêncio: o barulho dos pássaros, natureza, o nascer do dia.
  • Está em obras mas fica no topo do morro, com vista privilegiada da cidade.
  • Horários de funcionamento e detalhes no site oficial.
  • Entrada ao complexo de templos: JPY 400 (R$ 13,00)
Festival Seiryu-e, um dos principais eventos anuais no alto do templo. Foto: Kyomizudera.

7:30 - Higashiyama: na saída do Kyomizudera, tirem fotos nas ladeiras históricas antes das multidões chegarem.

  • Depois que as lojas abrirem, experimente o típico doce local yatsuhashi (um tipo de mochi triangular: doce de arroz, açúcar e canela), com recheios variados: doce de feijão, cerejeiras e outras frutas e até chocolate. Nessa ladeira que leva ao Kiyomizudera, muitas lojas oferecem degustação gratuita com um chá verde. (senchá). Aproveite o atendimento local!

8:00 - Ninenzaka: Parada topzera pro Instabreak na Starbucks.

Starbucks Ninenzaka Pausa pro café e fotos da casa tradicional mais polêmica da região. Chegue as 8h, antes das filas. Fotos: Fashion Press.

Não curto o café, mas tem doces e chás que são bons. O que vale mesmo é a apreciar a arquitetura e o design, apenas um break pra seguir.

8:30 -Da área de Ninenzaka, cruze o Maruyama Park, o Ibirapuera de Quioto. Pausa pra curtir o jardim, os pássaros e os locais. Siga adiante que chegará em frente ao próximo templo budista.

Higashiyama é como uma viagem no tempo ao antigo Japão. Em 1km, é possível avistar vários templos.

9:00 - Chion-in é um enorme complexo de templos, conhecido como um dos mais apreciados pelos japoneses. Costuma ser lindo em todas as estações e uma grande parte é gratuita, inclusive o hall central onde você pode assistir cerimônias budistas e observar o alta principal (geralmente pago). A parte paga é o jardim interno, que dará acesso a outra dimensão do templo (e vistas da cidade).

  • Horários de funcionamento e detalhes no site oficial.
  • Entrada ao jardim Hojo: JPY 400 (R$ 13,00)

10:30 - Heian Shrine é o templo xintoísta oficial do imperador, e por isso, tem horários para visita (diferentemente da maioria dos shrines, que por serem públicos, funcionam 24h por dia, todos os dias do ano). Entrada gratuita, jardim pago. Aproveite para apreciar a região de museus e teatros, com inúmeras opções culturais para todas as idades.

11:00 - Pausa para o almoço. Escolha um dos restaurantes perto do Heian Shrine. O Yamamoto Menzou é uma ótima opção de udon (versão do macarrão típico de Quioto).

Udon: no verão servido frio, para refrescar os dias quentes em Quioto. Foto: Yamamoto Menzou

12:00 - Metrô - Caminhe até a estação Higashiyama da linha Tozai, em direção a estação Nijojo-Mae.

Linha Tozai que cruza o rio desde Higashiyama até o castelo Nijo.

12:30 - Castelo Nijo, no 2o Patrimônio Mundial da UNESCO do dia, um dos monumentos históricos mais importantes e especiais. Visite o jardim, curta a paisagem e se deixe levar pela ostentação do tempo dos samurais.

13:30 - Ônibus ou táxi para o Palácio Imperial

14:00 - Palácio Imperial, aberto pra visita agendada e de graça (o de Tóquio costuma ficar fechado). Apresentar passaporte e agendar antecipadamente. Detalhes aqui.

15:00 - Pausa para café/chá. As lojas de chá e café ao redor do Palácio são uma boa pedida.

A linha de metrô Karasuma corta a cidade de Norte a Sul.

16:00 - Visita ao mercado Nishiki. Hora de experimentar quitutes e aproveitar as pechinchas do final do dia.

17:00 - O mercado fecha, mas no entorno existem opções de comes e bebes pra todos os gostos e bolsos. Aproveite para escolher um local aconchegante pra repor as baterias.

Ao final do dia, vá descansar pra recuperar as energias (e as pernas) pro próximo destino!

Se estiver em condições de continuar a saga…

22:00 - Gion: Hora de ver as gueixas a caminhar no bairro antigo ou Pontocho, depois que a maioria dos turistas estão dormindo.

Primavera: Março, Abril, Maio

Prepare-se para multidões de todos os cantos do mundo, principalmente na época das cerejeiras, que são realmente estonteantes. É basicamente como nossa época de Carnaval ou Reveillón: cidades como Quioto que tem apenas 1,4M de habitantes de repente recebe 1M de estrangeiros de uma vez só. O resultado são locais lotados, filas pra tudo, e praticamente raros espaços em que vc pode tirar fotos sem ter que sair no tapa com outros turistas.

Sanjusangendo: o templo budista com os guardiões de Buda. Uma das maiores estruturas em madeira do mundo. Photo: http://losarchivosdelbardo.blogspot.jp/2017/04/

Verão: Junho, Julho, Agosto

Vale a pena: ir pras áreas ao norte ou leste da cidade, com mais verde e brisa.

Arashiyama (floresta de bambu) e Fushimi Inari Taisha (os toris, portais vermelhoes que formam

Outono: Setembro, Outubro, Novembro

Vale a pena: Aproveitar a transição de cores, cheiros e sabores.

Arashiyama: além da floresta de bambu que fica a 30min do centro de Quioto. Pra chegar lá, só de ônibus ou JR Trem.

Inverno: Dezembro, Janeiro, Fevereiro

Dia de neve é sempre aventura. Kinkakuji, o Golden Pavillion (Templo Dourado). Foto: Toni Heikkinen

Hospedagem

Fechar acomodações nos sites costuma ser mais barato que diretamente com o local. Recomendo as regiões centrais, entre a estação JR Kyoto e metrô ao norte (Gojo, Shijo, Sanjo, Nijo, etc). Quanto mais perto do rio Kamogawa, mais bem localizado.

  • Airbnb: crédito de até JPY 3,700 com esse link.
  • Booking: crédito de R$ 50 com esse link.
  • Yokai Soho: um prédio restaurado, localizado numa área tradicional ao norte de Quioto (no final da antiga cidade), com estúdios & quartos estilosos, com espaço e bem iluminado. O arquiteto Benoit (francês) é quem idealizou o projeto com sua esposa Andrea (brasileira).

Transporte

  • Como chegar: Aeroportos mais próximos, se Quioto for sua 1a parada: Osaka tem 2 aeroportos: o KIX (Kansai International Airport) e o Itami (ITM). De lá tem ônibus executivo e trem direto pra estação JR Kyoto ou até pra outros pontos da cidade, dependendo de onde for se hospedar. O aeroporto de Nagoya tb é uma opção que pode sair em conta, além de menos movimentado. De lá, vc precisa pegar um ônibus ou trem até a estação JR Nagoya, e de lá são mais 30 min de Shinkansen). Chegando no aeroporto, só dizer que vc vai pra Quioto que o pessoal do balcão de informações já sabe o que te indicar. Fica a dica: quem tem tempo e pouca grana, pode pegar trens locais ou ônibus interurbanos, que costumam sair bem mais em conta. No Japão, as faixas de preço variam bastante. Na dúvida, pergunta qual seria a opção mais barata.
A cobertura das 2 linhas de metrô é bem limitada: Norte a Sul e Leste a Oeste. Para as demais regiões, existem trens ou ônibus municipais de linhas privadas. Nenhuma dessas empresas aceita JR Pass.
  • No destino: em Quioto vale andar de metrô e ônibus, mas ambos sistemas não são integrados. Se quiser comprar passes mais em conta, planeje seu roteiro diário pra evitar pagar tarifas individuais. As opções são os passes diários JPY 500 para o ônibus e JPY 600 para o metrô.
Mapa da linha municipal de ônibus urbanos da cidade de Quioto. Parece meio complicado (volume de informações) mas a ideia é achar o destino, e encontrar qual linha pegar. (Se fosse online, seria ideal)
  • A pé: A cidade é plana e cheia de ruazinhas encantadoras, que mais parecem cenário de filme. Mas a maioria das atrações fica bem espalhada, e pra aproveitar. Traga calçados confortáveis se for ficar só no sapatinho,
  • Bike: A melhor opção — faça como os locais e aproveite as ciclovias e os japoneses são o exemplo a ser seguido. Muitas empresas locais O maior detalhe é onde parar a sua bicicleta — a cidade está cheia de regras e o maior trabalho da polícia é caçar bicicletas paradas em locais proibidos.
  • Táxi: Evite se estiver com pouca grana. Costuma ser caro mas dá conta de agilizar sua vida de noite (transporte público não funciona aqui).

Há quase 3 anos aqui como residente de longo prazo, garanto que o melhor do Japão e de Quioto é aproveitar pra turistar, por isso se tiver dúvidas, me escreva. Me siga, dê um link e compartilhe, pra ajudar outros viajantes a se programarem. Beijo, Brasil!

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Sabrina Sasaki

Latina in Toronto. Principal@Monozukuri VC. Innovation, cultures & people. Investment & BizDev. Early Stage Hard-tech/Manufacturing Emerging Manager